

Este é um post de indignação. Não é a primeira vez, nem será com certeza a última, que alguém ao saber do meu gosto por BD (Banda-Desenhada) e por Comics acaba por escarnecer destes últimos (ou mesmo dos dois!). Usualmente ficam-se por maldizer os Comics. A justificação acaba por ser sempre a mesma: “Não gosto de super-heróis”. O que eu acabo sempre por entender é que essas pessoas percebem absolutamente quase nada de Comics. É perfeitamente aceitável, veja-se, ninguém precisa de saber o que são os Comics para bem da sua cultura, trabalho, vida social (por vezes é melhor nem saberem, em prol da sua vida social), sobrevivência, etc. No entanto, a ignorância nunca foi uma coisa bonita quando se teima em continuar a viver debaixo dela e quando confrontados com uma visão mais esclarecedora que poderia quebrar o preconceito. É, de facto, a teimosia no preconceito que me fere.
- Não gosto de super-heróis.
- Não gosto de super-heróis.
- Mas os Comics não são só
super-heróis. Se te deres ao trabalho de leres alguns dos posts que eu publico no meu bloguezito verás que muito poucos são sobre super-heróis, e mesmo esses são sobre super-heróis muito pouco convencionais, poderá dizer-se que são sobre “anti-super-heróis”.

- AH! Tudo bem, mas eu não gosto de Comics.
- E gostas de BD?
- Alguma. Gosto de Corto Maltese e do Bilal.
A conversa fica quase sempre por aqui. Mais pela vergonha que essas pessoas têm em falar de BD em público (não vão ser conectados com algo que é aparentemente visto como leitura para putos).
Devo acrescentar, antes de continuar, que aceito
sem qualquer tipo de problema que haja pessoas que pura e simplesmente não gostem de arte sequencial (chamem-lhe BD, Fumetti, Gibis, Mangá ou Comics). Gostos não se discutem, lá diz o povo. Não é minha intenção assumir qualquer papel de missionário para andar a converter quem quer que seja, por maior que seja a minha paixão. Também compreendo que muitas pessoas associem os “Super-Heróis” aos Comics. É natural que assim seja. A Industria dos Comics está conectada aos personagens que lhe deu força e notoriedade Mundial: Os “Super-Heróis”. Mas, Super-Heróis é igual a Comics? Não, não é. Ou, pelo menos, NÃO É SÓ igual a isso.

As pessoas que melhor me conhecem sabem que eu (já) não sou nenhum puto e que até tenho alguma cultura que me permite falar de inúmeros temas, tão díspares como a literatura (sem serem Comics ou BD, pois também são literatura…por muito que não concordem), religião, física, biologia, astronomia, astrologia, política (ao estilo taxista e mesmo na vertente da ciência política


Na vertente “Super-Heróis” dos Comics e desde os tempos do Superman (1932) e do Batman (1939) terem pela primeira vez aparecido muitas coisas mudaram. A primeira grande mudança deu-se no início dos anos 60



O sucesso estrondoso que esta receita trouxe ao mundo dos Comics fez (e faz) a delícia da
garotada e, porque não, das casas que as publicam, nomeadamente a Marvel e a DC a liderarem destacadamente o mercado multimilionário.

Mas a garotada cresceu e a mina de ouro não podia acabar ali, naquela idade público-alvo. Os próprios escritores/argumentistas e os artistas/ilustradores também ansiavam por criar coisas diferentes, ou recriar estilos mais antigos de Comics, estilos que antecediam o género “super-heróis” e que foram de grande sucesso. Estilos como o Policial Noir, o Hard-Boiled, o Terror e o Fantástico, a Guerra (com os seus heróis e anti-heróis, por sinal, muito humanos), a comédia satírica, o erotismo, a capa e espada, a espada e fantasia, etc. Foram muito mais abundantes nos Comics os géneros que não os dos Super-Heróis durante bastante tempo.





Com imprints como a Epic, MC2 e MAX pela Marvel; ou Helix, Vertigo, DC Focus, Elsworlds e Cliffhanger pela DC, ou mesmo a Amalgam das duas em conjunto, abriu-se um novo mundo de oportunidades. Algumas destas continuavam a dedicar-se ao universo de super-heróis, mas outras aproveitaram o distanciamento e dedicaram-se exclusivamente (ou quase) a géneros “super-heróis não entram”. Prendia-se também a oportunidade e vontade que muitos dos talentosos artistas e argumentistas tinham em deterem eles próprios os direitos sobre o seu trabalho, o que os títulos mainstream não possibilitam.





A IDW publica autores como Garth Ennis, Ben Templesmith. A WILDSTORM é representada por autores como Brian K. Vaughan e Warren Ellis ("Atmospherics", "Ocean"). Na Dark Horse são às dezenas os nomes sonantes de autores que escapam ao género “Super-Heróis”. A Image, com autores como, aqui também, Warren Ellis: "Ministry of Space". Já que gosto tanto de ler Warren Ellis, porque não também a Avattar Press, com títulos como "Freak Angels", ou "Crecy" na linha Apparat. Existem mais.

Claro que o mainstream é, talvez, o mais prestigiado e que faz realmente vencer um qualquer autor e artista na “gazilionária” Industria dos Comics. O convite para escrever um ciclo dos X-Men, do Wolverine ou do Spider-Man é absolutamente irrecusável.
Refira-se que o conjunto do autor/argumentista e do artista/ilustrador/co-autor é que faz a qualidade de um qualquer título. Mas, admite-se, que o autor/argumentista é o elo mais forte no sucesso desse título.
Eu ainda acompanho alguns títulos mainstream (com super-heróis); alguns para não “partir” a

Mesmo estes títulos mainstream evoluíram bastante. Os motivos são mais complexos, os personagens são bem mais tridimensionais, a influência política e mesmo geopolítica é uma constante, os diferentes aspectos e conflitualidades da actual sociedade são espelhadas nos intrincados argumentos, etc. Não se resume ao tipo que é “bom” a dar porrada no tipo que é “mau”. A divisão ou luta entre o “bem” e o “mal” não é tão linear, as questões morais diluem-se e são deixadas, muitas vezes, ao critério do leitor. Mas sim, continuam a serem tipos e tipas vestidos de licra, com máscara (ou não) e capinha esvoaçante.Para quem teima em associar Comics apenas a super-heróis, se se deram ao trabalho de ler este post talvez consigam agora ter uma visão mais abrangente. Eu não aprecio em especial o Expressionismo (tirando raras excepções), mas não posso dizer que não gosto de Pintura apenas por isso. Não aprecio certo tipo de Romance literário e não posso dizer que não gosto de ler. Não gosto de Jornais sensacionalistas, mas leio Jornais. Por tal, “não gosto de ler histórias com super-heróis, mas gosto de histórias whatever” é perfeitamente comum. Para quem não gosta de arte sequencial pura e simplesmente: Temos pena! Ninguém é perfeito :-)
Em suma: Comics é uma expressão de origem Inglesa que pode ter a tradução infeliz de "cómicos" e que designa as bandas desenhadas produzidas nos Estados Unidos da América.
