“Ōoku” é uma série que me deixou um bocado reticente em começar, pela sua inerente característica alcoviteira e, também, pela já gasta fórmula que a autora escolheu para lhe “trocar as voltas” (já lá irei). Mas, depois de pesquisar o que era o Ōoku fiquei bastante curioso quanto à forma em que a autora se propôs abordá-lo.
O que era o Ōoku? No ano de 1607, no início da era do período Edo (24-03-1603 até 03-05-1868), também chamado período Tokugawa, em que o Japão foi dominado por este Shogunato, o Shógun Tokugawa Hidetada, segundo Shógun deste período, filho terceiro do primeiro Shógun (Tokugawa Leyaso), decidiu criar uma ala em que residissem todas as mulheres ligadas ao Shógun. Nesta ala, embora conotada como um harém, residiam também a mãe e a esposa do Shógun. No Ōoku era proibida a entrada de homens adultos que não fossem a acompanhar o Shógun; este entrava no Ōoku por um corredor com o nome de Osuzu Rōka (“passagem dos sinos”), conhecido assim devido ao som dos pequenos sinos tocados que assinalavam a passagem do senhor, e todos tinham que se prostrar perante a sua passagem e olhá-lo era crime capital. As influências sobre o Shógun pela proximidade a este daquelas que no Ōoku residiam instituíam-no como um local de Poder. A intriga era uma constante. A responsável pelo Ōoku tinha um cargo com importância e consequente influência no nível da de um Alto Conselheiro (Rōjū), um dos mais altos cargos governamentais no período Tokugawa; durante este período o maior número simultâneo de Rōjū foi de cinco. O Ōoku estava desligado do resto do mundo japonês por decreto do Shógun, tinha leis e regras próprias e quem nele entrava só poderia sair, temporária ou permanentemente, com autorização expressa do próprio Shógun. O Sistema Ōoku durou por aproximadamente 200 anos.
Acredito que Fumi Yoshinaga propositadamente não quis saber em solidamente assentar o pressuposto, mas não é consistente na sua aparente escolha à medida que os enredos se deslindam (cá está, seria um spoiler).
Se ela não o quis fazer eu admito, num salto de fé, que as coisas neste mundo alternativo são assim com uma razão credível para o serem, apreciando apenas o mundo criado pela autora sem questionar a verosimilidade da sua existência, por vezes assumida e por vezes turva. Assim, os enredos tornam-se muito interessantes e bastante curiosos, tornando a leitura despreocupada, fácil e diferente daquilo que estamos habituados na Manga ou BD em geral. A linguagem formal e “à antiga”, na versão inglesa traduzindo o Nihongo feudal por um Inglês Vitoriano falso, assumem um papel importante que serve o propósito de melhor nos transportar à época, e, mesmo assim, a leitura é fácil, fluída.
O enredo tem uma história de fundo que tem sido transversal a todos o volumes, acompanhando o segredo do Shogunato, o como e o porquê desse segredo, assim como várias pequenas grandes histórias que enriquecem, substanciam, e acima de tudo revelam o mundo alternativo deste Ōoku.
O desenho é muito seguro, alterna o estilo “realista” com algumas expressões faciais exageradas bem colocadas.
Em suma, é uma leitura interessante, adulta, que nos prende à narrativa. Não sei se não cairia na tentação de a classificar como um Shoju invertido (esta inventei agora!). Merece bem as críticas muito positivas que tem tido. Eu recomendo-a a todos que gostem de temas mais adultos, mais literários.
Na senda de outras transposições ao grande ecrã, também esta série terá a sua.
3 comentários:
Estás mergulhado na profunda cultura manga. Não sei não se os teus textos já não constituiriam um belo livro sobre manga. E para quando um mergulho em profundidade na bd franco-belga??
Fosga-se...um comentário. Já fui largar um foguete. É a paga por deixar este blog às moscas por tanto tempo.
Ando a prometer-me comprar uma impressora com scaner faz imenso tempo. Assim que o fizer, optarei por pequenissimos posts com as capas da minha pequena colecção. Aí terei muita BD F/B.
Abraço e muito obrigado por comentares ;)
O Natal está aí... venha de lá essa impressora e os consequentes posts sobre bd-fb! :)
PS Em Janeiro combinamos um lanche/ajantarado cá em casa.
Abraço
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